“eu quero ir.”
“ir pra onde?”
“embora.”
“ir embora?”
“ir embora.”
“e pra onde?”
“não sei. só embora.”
“e por quê?”
“porque hoje acordei pensando que talvez o melhor fosse ir embora.”
“de onde? para onde? você vai me deixar, é isso?”
“sim. digo, não deixar você, mas deixar tudo. você está entre tudo o que existe para mim.”
“e o que você vai fazer, se matar?”
“não. não sei.”
“acho que você não está bem. acho que você precisa pensar melhor no que anda dizendo e nas vontades que tem sentindo.”
“é que às vezes é difícil de pensar e entender o que sentimos, inclusive as nossas vontades. especialmente as nossas vontades.”
“acho que você precisa de ajuda. uma terapia te auxiliaria, talvez.”
“é, talvez. mas hoje eu quero ir.”
“e não dá pra controlar essa tua vontade ‘súbita e imperiosa’?”
“não se controla vontades, ainda menos as ‘súbitas e imperiosas’. a questão não é que eu vá abandonar você aqui, te deixando em casa cuidando somente da tua vida, mas é que não tenho sentido vontade de nada além de ir.”
“então já é algo de tempos? essa ‘vontade’ já é pensada há tempos?”
“não. aconteceu hoje quando acordei. abri os olhos e vi os lençóis jogados no chão, e senti alguma coisa, não sabia o que era. mas aí me virei na cama e vi o teto, a lâmpada apagada, pendendo devagarzinho, o sol tentando entrar pelas frestas da janela do quarto, e aí descobri o que era: eu tinha que ir.”
“olha…”
“o quê?”
“…”
“desculpa, não é nada com você, com a gente. talvez seja com a gente, já que eu sou parte de nós dois, mas…”
“vai.”
“oi?”
“vai embora.”
“… obrigado.”
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Sabe quando ler um texto dói?
Então. Esse deu uma dorzinha. Especialmente no final, com o consentimento para simplesmente ‘ir embora’. É um sentimento familiar. Curti. Gosto de textos-diálogo e esse foi muito bem desenvolvido.
tive a impressão de já ter lido isso, mas esse consentimento final me pegou de jeito.
FH
Esse foi o que eu menos gostei dos três que li agora. Acho que por me identificar menos, não sou dotada desse altruísmo. Mas, como sempre, narrativa impecável.